Janeiro começou mal para a indústria dos meios de comunicação. Desde os grandes actores globais às pequenas empresas, multiplicam-se os sinais de alarme. O gigante digital BuzzFeed, que em 2015 ultrapassava os 200 milhões de visitantes únicos por mês, e que ainda em 2018 facturou 300 milhões de dólares, anuncia o despedimento de 15% dos seus efectivos, o que equivale a 218 trabalhadores. Fechou o seu site em Espanha, três anos depois de o abrir.
Os grupos Verizon e Gannett anunciam despedimentos ou rescisões. Nos Estados Unidos, há menos jornais e menos proprietários de jornais - portanto mais concentração em grandes corporações. Tudo junto, não parecem ser factos pontuais, “mas sim o sintoma do começo de uma nova etapa de alta incerteza”.
A reflexão é de Miguel Ormaetxea, editor de Media-tics - para quem mesmo os meios digitais, “se dependerem exclusivamente das receitas da publicidade, vão ter dificuldades nesta segunda parte da crise”.
O autor do artigo que citamos refere que, mesmo grandes jornais de referência nos EUA, como The New York Times e The Washington Post, encontram-se no patamar que têm porque são redigidos em inglês e se tornaram publicações globais. Só o primeiro tem três milhões de assinantes, com uma receita líquida de cerca de 25 milhões de dólares.
Cita a seguir a reflexão que Jeremy Littau, docente de jornalismo, sintetiza na sua página de Twitter, sobre a “descida aos infernos” dos media nos EUA, desde os “anos dourados” da segunda metade do séc. XX até ao panorama actual. Na opinião deste autor, essa “idade de ouro” terminou nos finais dos anos 80, mas os editores não estiveram à altura da nova concorrência, acumulando uma dívida maciça.
Mais grave de tudo, perderam o controlo da distribuição para as grandes plataformas. Com o desenvolvimento da publicação digital, “os editores que não estavam habituados à concorrência e não tinham investido na inovação estavam agora a concorrer com mais do que o seu rival do outro lado da cidade (se ainda havia algum, porque as concentrações e fusões de meios também tinham acabado com eles)”.
“Os números de circulação continuaram a cair e esta tendência acelerou no princípio da última década. Com menos leitores e um enorme serviço de dívida, tornou-se uma espiral viciosa que exigia mais cortes para atingir as exigências da dívida e satisfazer os accionistas habituados a grandes lucros.” (...)
O mapa de receitas da Imprensa americana, de 1950 até hoje, que vem junto destes posts de Jeremy Littau, é aquilo que ele mesmo chama o gráfico Oh My God das suas aulas de introdução ao curso.
Um outro relatório que é citado no artigo de Miguel Ormaetxea (divulgado há poucos dias no NiemanLab), aponta que o preço dos jornais diários, nos EUA, subiu para mais do dobro numa década, com The New York Times a pedir mais de mil dólares pela assinatura anual impressa, e The Boston Globe e The Washington Post entre os 750 e os 650 dólares. O custo por exemplar, nos quiosques, varia entre os dois e os três dólares.
“O crescimento do modelo de assinatura tem sido um dos maiores avanços nestes últimos anos, mas alguns especialistas prevêem que este sistema tem condicionantes e limites claros. As pessoas podem assinar um jornal nacional e outro local, mais a Netflix, a Hulu, a HBO Go, The Athletic e ainda o seu podcast favorito?” (...)
A concluir, o autor adverte que, em Espanha, os meios digitais já estão a chegar ao tecto possível das suas audiências:
“Nos dois últimos anos, não passámos dos 33 milhões de utentes únicos. Em Novembro, El País tinha 15,12 milhões e El Mundo 15,05.” (...)
O artigo aqui citado, na íntegra em Media-tics; e os posts de Jeremy Littau
O risco da desinformação organizada “só vai aumentar em todas as eleições daqui para a frente”, porque as tecnologias que estão a ser desenvolvidas “vão tornar cada vez mais difícil identificar as informações falsas”.
“Os Estados começam o compreender que não é difícil fazer isto e que não é preciso um grande investimento” - declarou Marine Guillaume, chefe da missão “Cibersegurança e assuntos digitais” do Ministério dos Negócios Estrangeiros de França, durante uma conferência sobre “Ingerências e desinformação no horizonte das eleições europeias”, promovida pela delegação da Fundação Calouste Gulbenkian em Paris e Notre Europe - Instituto Jacques Delors.
Também presente na conferência, Ricardo Gutierrez, secretário-geral da Federação Europeia de Jornalistas, contou que esteve com alguns dos jovens que produziam informações falsas na Macedónia e que o que faziam “é algo completamente artesanal”.
Há trabalhos de reportagem que uma só redacção, de um pequeno jornal local, não consegue assumir. É aqui que entra o jornalismo de colaboração. O exemplo citado é o de três diferentes meios de comunicação que se “coligaram” em Las Cruces, no Estado de New Mexico, nos EUA, para fazer jornalismo de investigação e proposta de soluções sobre o inadequado sistema de saúde estadual, na área de comportamento (saúde mental e dependência).
Assim, o jornal digital NMPolitics.net, o diário Las Cruces Sun-News e a rádio KRWG uniram meios humanos, sob a direcção de Heath Haussamen, o editor do primeiro, para produzir, ao longo de um ano, uma série que tomou o título global de Distressed [à letra, aflitos, angustiados].
“Como editor do projecto, estive imerso em versões destes textos e vídeos. Senti-me indignado. Por vezes chorei. Aprendi muito e senti-me motivado a agir. Espero que todos o façam também” - declara Heath Haussamen, no artigo que aqui citamos, na International Journalists’ Network.
Lançado em Novembro de 2015, este site tem vindo a conquistar uma audiência crescente, traduzida no número de visitantes e de sessões e do tempo médio despendido. É reconfortante e encorajador, para um projecto concebido para ser um espaço de informação e de reflexão sobre os problemas que se colocam, de uma forma cada vez mais aguda, ao jornalismo e aos media.
Observa-se , aliás, ressalvadas as excepções , que a problemática dos media , desde a precariedade dos seus quadros às incertezas do futuro - quer no plano tecnológico quer no editorial - , raramente constitui tema de debate nas páginas dos jornais, e menos ainda nas suas versões online ou nos audiovisuais. É um assunto quase tabú.