Em Abril deste ano, o governo português aprovou a Carta de Direitos Humanos na Era Digital que obteve, entretanto, a chancela de Belém.
A nova legislação foi aprovada em votação final global, com os votos do PS, PSD, BE, CDS, PAN, das deputadas não inscritas Joacine Katar Moreira e Cristina Rodrigues e a abstenção do PCP, PEV, Chega e Iniciativa Liberal, e resultou de dois projectos, do PS e do PAN.
Neste documento fala-se de “direitos”, “liberdades e garantias dos cidadãos no ciberespaço”, mas, igualmente, de uma tarifa social de acesso à Internet.
Além disso, a lei compromete-se com o combate às “fake news” para “proteger a sociedade contra pessoas singulares ou colectivas, ‘de jure’ ou de facto, que produzam, reproduzam e difundam narrativas” desse tipo.
Está previsto, neste sentido, que qualquer cidadão tem o direito a apresentar queixas à Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) em casos de desinformação.
Apesar de este documento se apresentar como uma tentativa bem intencionada de regular o espaço “online”, alguns comentadores têm-no classificado enquanto medida censória, danosa para a liberdade de imprensa e de expressão.
É o caso de José Pacheco Pereira e de António Barreto que, na edição de 29 de Maio do jornal “Público”, compararam, nos seus respectivos textos de opinião, a Carta de Direitos Humanos na Era Digital ao “lápis azul” do Estado Novo.
Para Pacheco Pereira, tudo neste documento “é mau”: “a atribuição de actividades censórias à Entidade Reguladora para a Comunicação Social, o apelo à bufaria, a inexistência de medidas para efectivamente combater o cibercrime sob controlo judicial e não por uma ‘entidade’ de nomeação partidária, o palavreado politicamente correcto que é hoje norma do ‘politiquês’”.
Da mesma forma, António Barreto considera que “esta lei consiste no mais atrevido ataque à liberdade de expressão desde há quase um século”, já que é “ uma tentativa violenta de impor uma moral, de regular o pensamento, de orientar as mentalidades e de condicionar convicções”.
De acordo com Pacheco Pereira, tudo isto foi feito sob a capa de um “direito à protecção contra a desinformação”, com a pretensão de “proteger” os cidadãos contra uma forma peculiar de “narrativas”.
Pacheco Pereira ressalva, por outro lado, que a parte final do documento prevê a penalização de quem ameace os “processos políticos democráticos”, os “processos de elaboração de políticas públicas” e os “bens públicos”, o que “serviria para impedir e punir qualquer crítica ao Governo”.
Ora, para Pacheco Pereira, “numa sociedade democrática, onde há liberdade de expressão, não se pode controlar e muito menos punir através de uma qualquer ERC ‘informações falsas, imprecisas, enganadoras, concebidas, apresentadas e promovidas para causar dano público ou obter lucro’”.
Além disso, aquele comentador político recorda que “ser enganado é um custo da liberdade, mas é mil vezes melhor do que dar ao Estado o poder de decidir o que eu devo ou não conhecer, pela censura do que é informação e do que é ‘desinformação’.
“‘A censura protege-vos’ era o grande lema da censura dos 48 anos de ditadura”, conclui.
Também António Barreto faz alusão ao “ famoso artigo 8.º da Constituição de 1933, do Estado Novo de Salazar”.
Neste artigo previa-se que “a liberdade de expressão do pensamento sob qualquer forma (…) é um direito e uma garantia individual do cidadão”, ressalvando, por outro lado, que as “leis especiais regularão o exercício da liberdade de expressão do pensamento (…) devendo prevenir preventiva ou repressivamente a perversão da opinião pública na sua função de força social e salvaguardar a integridade moral dos cidadãos”.
“Através da ERC, de agências e serviços a criar, de ‘estruturas de verificação’ a acreditar, de associações a reconhecer, de jornais ou televisões a certificar, de ‘selos de qualidade’ a distribuir, de institutos universitários e centros de estudos académicos em que delegar competências, o Estado prepara-se para pagar o funcionamento de uma rede infernal de delação, supervisão e vigilância, enquadrada num esforço estatal de defesa da verdade, da narrativa autêntica e de elevação moral, assim como da protecção dos fracos, dos vulneráveis e de todos os públicos especiais, o que quer dizer, de toda a gente”, acrescentou Barreto.
Por outro lado, Barreto recorda que “é verdade que a lei é mal feita, mal escrita e perversa” e que, por isso, "talvez seja mudada a curto prazo ou nunca venha a ser aplicada”.
Ainda assim, “o que é certo é que o dispositivo autoritário está criado”, defende, acrescentando que “os autores e os que aprovaram esta lei vão ficar na história. Pelas piores razões”.
Com as vagas de desinformação que começaram a circular “online” nos últimos anos, passou a ser necessário partilhar, com eficácia e clareza, as definições de “notícia” e de “jornalista”, para que o público consiga acompanhar as profundas transformações do mundo mediático, considerou Sabine Righetti num artigo publicado no“Observatório da Imprensa”, com o qual o CPI mantém um acordo de parceria.
Isto porque, explicou a autora, se, há dez anos, a produção noticiosa era um papel exclusivo do jornalista, que colaborava com títulos informativos, actualmente, qualquer um pode escrever um artigo, partilhando-o através das redes sociais.
Ou seja, hoje em dia, é preciso ressalvar que nem todo o utilizador da internet que partilha uma peça, de cariz informativo, pode ser considerado um jornalista. E que, por outro lado, nem todo o cidadão com actividade declarada como jornalística cumpre as normas deontológicas, confundindo-se, por vezes, com um activista.
Portanto, considera Righetti, há, agora, uma hibridização do conceito.
Por isso mesmo, definir quem é, ou não, um jornalista, é uma tarefa cada vez mais difícil de concretizar, explicou a autora. Isto porque, já nem os documentos legais são considerados válidos, perante o panorama actual.
Neste âmbito, Righetti recorda que, no Brasil, conceito de jornalismo foi definido por um decreto, de Março de 1979, que instituiu que a profissão de jornalista compreendia actividades como “redacção, condensação, titulação, interpretação, correcção ou coordenação de informação a ser divulgada” ou “comentário ou crónica, a serem partilhados através de quaisquer veículos de comunicação”.
Além disso, naquela época, a “empresa jornalística” era um elemento central da actividade. O jornalismo, então, era tudo aquilo feito nos “media” formais.
E mais: o exercício da profissão de jornalista, de acordo com a legislação, exigia o registo prévio no Ministério do Trabalho, mediante a apresentação do comprovativo de nacionalidade brasileira, do diploma de curso superior de jornalismo e da carteira de trabalho.
Em 2009, relembra a autora, o STF (Supremo Tribunal Federal) retirou a exigência do diploma para o exercício da profissão. Ainda assim, as empresas de jornalismo contratavam, na sua maioria, colaboradores especializados para fazer jornalismo.
Só que o jornalismo, continua Righetti, cada vez mais, começou a sair das “empresas jornalísticas” e ganhou outros espaços que a legislação das décadas de 1960 e 1970 jamais poderia ter previsto.
Os leitores de notícias podem dividir-se em seis categorias, dependendo das suas necessidades e interesses, concluiu um relatório do “Financial Times”, citado pelo"Laboratório de Periodismo”, cujas conclusões podem ajudar outros “media” a reter subscritores.
De acordo com o estudo, por norma, os cidadãos consultam os títulos informativos com um de seis objectivos: manterem-se actualizados, alargarem a sua contextualização sobre o mundo que os rodeia; educarem-se sobre um determinado tópico ou personalidade; divertirem-se através de artigos lúdicos ou actividades didácticas; inspirarem-se ao lerem histórias sobre alguém que superou adversidades; e seguirem as tendências do mundo ‘online’.
Assim, a fim de terem sucesso junto do público, explica o documento, os jornais devem identificar a categoria com a qual a maioria dos seus leitores se identifica, para que possam continuar a captar o seu interesse, gerando um maior número de subscrições e, consequentemente, mais receitas.
O “Financial Times” realizou esta experiência junto de três editoras distintas, ajudando-as a compreender aquilo que poderiam fazer para optimizar a interacção com o público.
A editora 1, por exemplo, concluiu que 40% dos artigos que produzia eram da categoria “actualize-me”, mas que estes geravam, apenas, 13% de visualizações de página. Por outro lado, os artigos da categoria “entretenimento” representavam 19% do total de artigos publicados, mas, geravam 43% das interacções.
Este espaço do Clube Português de Imprensa vai fechar para férias durante o mês de Agosto.
É uma opção adoptada desde o lançamento do site em Novembro de 2016.
Recorde-se que o site se divide em três grandes áreas de conteúdos, com uma coluna de opinião a cargo de jornalistas e investigadores das Ciências de Comunicação, resumos informativos e propostas de reflexão sobre as grandes questões que se colocam hoje na paisagem mediática e à função jornalística.
O site do CPI conta, ainda, com as parcerias do Observatório de Imprensa do Brasil e da Asociacion de la Prensa de Madrid, dos quais publica regularmente trabalhos de análise em diferentes perspectivas, desde a ética profissional aos efeitos das mudanças tecnológicas.
O CPI, associação reconhecida de Utilidade Pública fundada em Dezembro de 1980, integra o Prémio Helena Vaz da Silva, instituído conjuntamente com o CNC-Centro Nacional de Cultura e Europa Nostra, e lançou em 2017 o Prémio de Jornalismo da Lusofonia, em parceria com o Jornal Tribuna de Macau e a Fundação Jorge Álvares.
O Prémio de Jornalismo da Lusofonia, cuja atribuição foi interrompida devido à pandemia, destina-se a jornalistas e à imprensa de língua portuguesa de todo o mundo, "em suporte papel ou digital", de acordo com o regulamento.
Ao concluir mais um ciclo de actividade do Clube e do site em particular, é muito gratificante saber que, apesar dos sobressaltos e das incertezas que afectam os media, o número de frequentadores habituais deste espaço tem vindo sempre a aumentar e a consolidar-se, designadamente, na sua visibilidade internacional, medida pela Google Analytics.
Aos associados, amigos e visitantes deste site o CPI deseja boas férias! E até Setembro.